O que sobrou de nós



Ela entrou na livraria esfregando as mãos para tentar aquecê-las. Lá fora o termômetro no meio da praça marcava oito graus. Dá pra acreditar? Oito graus em um dia importante como aquele.

Olhou para a mesinha próxima a cafeteria que fica à esquerda, bem próximo da prateleira dos livros preferido dele. Costumavam sentar naquela mesinha para beber café e conversar sobre filmes, livros e todas as outras paixões que tinham em comum.

Seus pés como de costume a guiaram para aquela direção, como se estivessem programados para fazer aquele caminho. Ela tocou a mesinha com as pontas do dedo e sentiu a rasura onde ele marcou com as iniciais M&S. Aquilo era tudo que havia restado do tempo que ela tanto sentia saudades.

A porta da livraria se abriu fazendo os sinos tocarem avisando um novo cliente. Ela, assustada, afastou-se da mesinha. Era ele, ela podia sentir seu estômago gelar e, definitivamente, não era devido à temperatura lá fora. Ele tinha esse estranho poder sobre ela. Ela não precisava estar vendo-o para saber que estavam no mesmo ambiente. Suas amigas costumavam rir e dizer que era besteira, mas ela sabia que quando se tratava dele, nada era besteira. Era tudo dolorosamente real.

Ela virou lentamente e por entre os fios ruivos conseguiu uma visão perfeita dele e... dela. Sua namorada. Ela nunca teve que dividi-lo antes, essa era sua primeira namorada e tudo que ela temia era que fosse a última. Ela temia que ele descobrisse que ela era a escolhida para dividir sua vida. Teve um tempo que chegou acreditar que esse dia não chegaria. Agarrou-se na possibilidade de ter seus sentimentos correspondidos, talvez seja por isso que dói tanto a realidade agora. Passou tanto tempo acreditando que seriam um casal, que agora ao ter outra garota entre eles, parecia traição, completamente errado. 


Ela estava enganada quando pensou que estava pronta para esse momento. Devia ter levado em conta seu coração martelando seu peito e seu interior que gritava em alto e bom tom: NÃO VÁ.



- Ei, ela está ali. - Ela ouviu seu timbre rouco alertando a menina ao seu lado e cada partícula do seu corpo se agitou. Suas mãos tocavam a dela e eles estavam caminhando em sua direção. - Oi. - Ele sorriu, fazendo o mundo dela todo em pedaços.

- Olá. - Ela respondeu em um fio de voz. Na verdade, nem sabia se teria sido o suficiente para ele ouvi-la.

- Marie, essa é a Elena. Minha namorada. - Ele falou olhando a garota dos cabelos ruivos. - E Elena, essa é a Marie. Minha melhor amiga. - Completou piscando os grandes olhos azuis que ela tanto amava. Costumava imaginar que estava nadando em Tenerife Sea enquanto ele estava distraído e ela encarava seus olhos. 


Era estranho como as coisas mudavam da noite para o dia, em um dia era somente ele e ela, e agora já não era mais. Ele já não pertencia mais a ela, mas talvez a verdade seja que nunca pertenceu. As tardes na livraria nunca mais seriam as mesmas, disso ela tinha certeza. A sensação de frio no estômago, que antes era de alegria de vê-lo, agora era de angustia por ter que encará-lo de mãos entrelaçadas com outra. Ela buscava entender por que as coisas aconteciam como aconteciam. Quer dizer, por que ele nunca conseguiu enxergá-la da mesma maneira que ela o enxergava? Por que ela nunca conseguiu tê-lo da forma que ele a tinha? Ela só buscava entender todos essas perguntas há tempos sem reposta. Ela só queria ser dona de si por inteira, estava cansada de deixá-lo levar, sem protestos, partes dela toda vez que partia. 

1 comentários:

  1. Nossa, meu, que bad. Esse texto caiu como uma luva no meu emocional hahah ):

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