Resenha: Lágrimas Agrestes

Título: Lágrimas Agrestes

Autora: Letícia Sardenberg

Editora: Independente

Páginas: 92

Ano: 2016

E-book recebido em parceria com a autora Leiticia Sardenberg

Com linguagem sedutora, expressões inventivas como “pisando elefantemente”, “meus pés só acordariam para dentro”, “os restos de mim cabiam com folga no buraco do assoalho”, diálogos perfeitos e ritmo tenso, Leticia Sardenberg envolve o leitor desde as primeiras linhas. E o leitor se sente coautor da narrativa, agarrado aos medos, às frustrações e aos sonhos da jovem Damiana, sem querer parar, atordoado de suspense, angústia e compaixão. Negra e mais velha do que a irmã Ritinha, as duas abandonadas num orfanato no sertão da Bahia, Damiana se viu separada da pequena lourinha escolhida por um casal do sul do Brasil, e a partir daí convive com uma saudade extrema e dilacerante. No entanto, Damiana gosta de ler, é sonhadora e determinada. Rapidamente conquista duas grandes amigas no orfanato: Francisca e Luciana. Essa amizade solar faz reviravoltas, cria situações de alegria e coragem. Emoções fortíssimas acontecem no decorrer de toda a história, em meio à violência, à fome, ao descaso, à crueldade, ao preconceito e à miséria, mas, especialmente nos últimos capítulos, momentos de grande tensão poética e humana deixarão o leitor surpreso e encantado, contente, acabrunhado, pensativo, atônito, com certeza mais rico em sentimentos e visão crítica da vida, diante dessa menina transmudada em professora, que lá no início, “agrestemente”, disse: “Eu mesma haveria de dar destino à minha vida.”

Lágrimas Agrestes é um livro forte que retrata a vida de Damiana desde a infância sofrida. Órfã de mãe e abandonada pelo pai alcoólatra, é ela quem cuida da recém-nascida Ritinha, sua irmã por quem cria apego maternal. Entretanto, as circunstâncias da vida as separa e seu maior sonho é reunir-se novamente com sua amada irmã e ser adotada pela nova família dela.

Quem nunca ouviu falar das dificuldades de uma vida num orfanato que atire a primeira pedra. Em Lágrimas Agrestes vemos de perto a fome, a miséria e o abandono que acompanham Damiana desde que se entende por gente. É angustiante ler e saber que, infelizmente, existem milhões de Damianas pelo mundo.

Sua vida nos orfanatos não foi nada fácil, mas a esperança de reencontrar a irmã foi quem a manteve viva e perseverante.

O livro é pequeno e foi lido em uma tarde. A narrativa é tão real, tão vívida, que tive a impressão de que o livro realmente foi escrito pela Damiana, ou que a autora passou por tudo aquilo.

Apesar de pequeno e de ter poucas falas, temos uma descrição impecável de cenários, sotaques e sensações. Um livro que te prende desde as primeiras frases e muitíssimo bem escrito.

Quero deixar aqui algumas observações quanto aos sotaques da estória: eu sou do interior da Bahia e o meu Estado tem inúmeros sotaques, com misturas de diversas regiões. Aqueles sotaques vistos nas novelas representam apenas a região metropolitana. No resto do estado temos um pouco de mineiro, de goiano, de pernambucano, tudo misturado ao nosso próprio modo de falar. Mainha, painho, oxe.. São expressões que compõem os nossos diálogos e isso é bem mostrado no livro. Tanto que eu pensei que a autora fosse baiana ou nordestina. Rsrs

A capa do livro é bem condizente com o conteúdo e, ao meu gosto, muito bonita. Como li o ebook, ele não tem diagramação. Já disse que o livro é muito bem escrito, não só pela estória, mas por não conter (eu pelo menos não encontrei) erros gramaticais. A escrita da autora é leve e fluida, e o livro muito gostoso de ler, o que proporcionou uma leitura ainda mais rápida.

Lágrimas Agrestes é um livro que deve ser lido por todos aqueles que têm curiosidade de "ver" de perto o sofrimento de crianças pobres, famintas e abandonadas. Tão sem expectativa de vida que é impossível não se compadecer e se emocionar por suas situações.

Eu não consideraria o final do livro feliz, apesar de não ter sido triste. É agridoce. Eu torço pra que as Damianas da vida tenham um final feliz de verdade, com muito amor, afeto, conquistas e uma família.

NOTA 5

Agradecimentos da autora:

Stella Maris Rezende, escritora (citando os prêmios por elas recebidos): autora da quarta capa/sinopse de Lágrimas Agrestes;

Bia Carvalho, escritora: autora da capa de Lágrimas Agrestes;

Ana Raquel, ilustradora: autora da capa de Minissaia, batom e futebol;

Patrícia Melo, ilustradora e designer: autora da capa de Eu, meu cachorro e meus pais separados.